1 - A chegada do neném!

            “Só vai te dar dor de cabeça”! “Vai te deixar na mão”! “Pra quê querer sofrer”? Essas e outras foram as primeiras frases que ouvi ao anunciar que queria e, dessa vez iria, comprar meu fusca! O possante? Um fusca branco, ano 1977, bastante (re)ajeitado! O antigo dono, um amante de antiguidades, já havia investido uma grana na nave! Advogado, sempre de terno, não queria ter que empurrar fusca nas ruas calorosas de Cacoal, interior de Rondônia, que fica no interior da Amazônia, localizada na região Norte do Brasil, onde a temperatura média fica lá na casa dos 30 e poucos graus!

Pois bem, para não passar calor e sufoco empurrando o Bad Bug, “Besouro mau” como apelidou o 77, o advogado investiu na parte mecânica, elétrica e alguns outros detalhes, como freio a disco e coisinhas assim! Comprei este fusca, desse advogado, pois senti na paixão dele por carros antigos, que teria um parceiro quando precisasse. Ou melhor, quando o meu fusca precisasse!

Antes de me entregar, o advogado mandou o fusca para a oficina para (re)ajeitar ainda mais alguns detalhes que para ele, acostumado com antiguidades, já não fazia tanta diferença, mas que para mim, iniciante nessa vida antiga, fariam uma diferença enorme.

Detalhes como a falta de pedaleira no acelerador. O advogado, já tava fera em acelerar triscando o pé apenas numa barrinha minúscula (encaixe da pedaleira), mas a jornalista aqui, na primeira volta no fusca, antes de fechar negócio, se lascou e muito. Na única quadra por onde conseguiu trafegar com o possante, desfilei parecendo numa escola de samba. Foram tantos baques, ocasionados por triscadas não tão sutis no acelerador, que a minha coluna quase sucumbiu. Mas o pior foi agüentar as gargalhadas ininterruptas da minha irmã, que junto comigo foi fazer o primeiro test drive.

Pois bem, por situações assim, o advogado resolveu levar o fusca para a oficina e entregá-lo à minha pessoa, apenas quando ele estivesse pronto para ser dirigido por uma jornalista sem muita sutileza. Outro detalhe importante, foi elevar a suspensão. Pois carro rebaixado, eu não ia querer de jeito nenhum... Em minha cidade, que não andava muito bem do asfalto, seria o “ó” desviar das craterinhas num fusquinha rebaixado! Então, elevá-lo foi outro detalhe.

Tudo ok na oficina, foi hora de levar o fusca 1977 para o Detran, vistoriá-lo e deixar ok também a documentação! Eu, “gracias a Dios”, não precisei me preocupar com nada. O advogado fez tudo sozinho e certinho! Deixou o carro mecânica e documentalmente bem, pronto pra mamãe aqui, que aguardava ansiosa a chegada do seu tão sonhado bebê! Afinal, desde os tempos do primeiro clássico Herbie, a ainda menina queria ter seu fusca. Sete anos depois de conquistar a sua habilitação, finalmente alcançava meu sonho, conquistava o meu fusca.

Sem nenhum incentivo psicológico por parte da mãe, mas com todo o apoio financeiro, o fusca finalmente era meu! Minha mãe, como toda mãe, não queria que eu sofresse... mas não se negou a me ajudar a realizar meu sonho

! O empréstimo me garantiu comprar o 1977, mas o que ouvi foi curto e direto. “Te empresto o dinheiro para você poder comprar, mas não vou te dar um tostão para consertá-lo”. Ok mãe, achei justo. Aliás, nada mais justo! Quem também colaborou, e muito, foi minha mana! Para não pegar só a grana da mãe, ela também me ajudou!

Dinheiro na mão, fuscão (re)ajeitado e vistoriado, hora de pegar a máquina! Contrato assinado, documentação em dia, pronto era meu! Ainda nem acreditava: eu tinha um fusca! Era meu! Ainda não tava pago o empréstimo para a mamis, mas era meu! Era eu quem ia andar com ele pelas ruas crateradas de Cacoal! Era eu que agora ia poder fazer dele o que eu quisesse! Era meu gente... sabem o que era isso? Eu havia realizado o meu grande pequeno sonho automobilístico que era ter um fusca!

Enquanto tantos brasileiros sonham com o carro zero, do corrente ano, eu sonhava e agora tinha o meu fusca. Independente de qual ano ele havia nascido, eu só queria era ter um fusca. O meu, por mero acaso do destino, era um 77! E assim ficou: eu, de 88, era 11 anos mais nova que meu fusca 77! Mas era meu, era o meu fusca 77! 

(Por Giliane Perin)